Perfeição. Frescor. Natureza. Amor. Beleza. Essas são as palavras que vêm à mente de um espectador ao ser ungido – no contato inaugural ou não – com o óleo das pinturas da série Fragmentos de Natureza de Irley de Jesus. Umedecidas pelas gotas da chuva, as folhas e flores úmidas, após uma tromba d’água na Bahia, exalam vida: é difícil não se impressionar com a obra e seu autor!
Com nome abençoado e vida marcada pela superação das sequelas de uma poliomielite, a formação do baiano de Caravelas é inversamente proporcional à sua técnica, hiper-realista, uma segunda vitória impensada. Ambas transformam o artista em um exemplo de superação de vida e obra.
Aos 12 anos, em 1982, quando havia rumado para o interior de Teixeira de Freitas, na casa dos avós maternos, despertou para a arte. O avô, carpinteiro, aplainava tábuas de 20cmx30cm, e o tio também preparava os chassis de madeira sobre os quais Irley pintava com tinta guache suas obras, retratando as cenas do cotidiano. Três anos depois, foi a mãe, dona Valmira de Jesus Leal - cujo sobrenome artístico adotou -, quem o matricularia em cursos de pintura em pano de prato. Naquele momento, seu universo foi povoado por frutas, cestas com flores, e a mãe fazia os bicos de crochê e sobre os vasos de cerâmica, confeccionava flores e fruta de epóxi.
Em 2010, já estava expondo na China. A série era Mulheres Invisíveis. Na ocasião, ganhou uma câmera fotográfica de presente, o que lhe permitiu guardar mais imagens do que a memória conseguiria reter, acervo que depois seria convertido em pinturas a óleo. Mais adiante, uma nova máquina fotográfica com zoom possibilitaria agigantar os detalhes. Em 2012, surgia a primeira pintura,a partir da coleta diária desse material em passeios pelo quintal, atento à “poesia da natureza”.
Impressionante o resultado das obras inspiradas na natureza e também o relato de Irley sobre o seu cotidiano, antes do nascimento das pinturas:
“A minha intimidade com o chão é diferente. Sem a órtese, eu ando de quatro e então desenvolvi uma intimidade com o chão. Principalmente, quando amanhece chovendo e vem o sol, eu calço a órtese ou vou rastejando mesmo até o quintal e tem um vasto cenário para eu fotografar. A terra molhada conta muito da minha história. A coisa da água me encanta: a luz atravessando a gota d’água e projetando o reflexo. E a folha é a vida: a árvore tem um tempo, a folha cai e depois é o próprio alimento da árvore. Estou pensando em Monet, que preparou o próprio jardim, tema durante toda a vida”.
O artista ainda acrescenta: “a outra coleção, o outro lado meu, por enquanto, não tem nome”. Trata-se do resultado das pinturas das imagens que ele coleta com a lente de aproximação da câmera fotográfica em cenário urbano, como alguém no meio da rua ou lendo um livro, sem que esses personagens anônimos percebam a sua presença no cenário. Difícil depois é encontrar a tinta para as obras pintadas a óleo com um hiper-realismo que nos faz aproximar para ver a tela ainda mais em close.
Cézar Prestes, gestor cultural, marchand e curador. Teve atuações como Secretário de Estado da Cultura do Rio Grande do Sul, diretor do Departamento de Patrimônio Histórico, Museus e Arquivos do RS, Museu de Arte do RS Ado Malagoli (MARGS), diretor e curador do Centro Cultural Aplub e das suas galerias Grafite e Cézar Prestes Artte. Entre suas ações, como diretor do MARGS, realizou a exposição Arte na França, que atraiu 37 mil visitantes do Brasil e do exterior.
@cezarprestes